Ana De Amsterdam

Chico Buarque

Sou Ana do dique e das docas

Da compra, da venda, da troca das pernas

Dos braços, das bocas, do lixo, dos bichos, das fichas

Sou Ana das loucas

Até amanhã

Sou Ana, da cama

Da cana, fulana, bacana (sacana)*

Sou Ana de Amsterdam



Eu cruzei um oceano

Na esperança de casar

Fiz mil bocas pra Solano

Fui beijada por Gaspar



Sou Ana de cabo a tenente

Sou Ana de toda patente, das índias

Sou Ana do Oriente, Ocidente, acidente, gelada

Sou Ana, obrigada

Até amanhã, sou Ana

Do cabo, do raso, do rabo, dos ratos

Sou Ana de Amsterdam



Arrisquei muita braçada

Na esperança de outro mar

Hoje sou carta marcada

Hoje sou jogo de azar



Sou Ana de vinte minutos

Sou Ana da brasa dos brutos na coxa

Que apaga charutos

Sou Ana dos dentes rangendo

E dos olhos enxutos

Até amanhã, sou Ana

Das marcas, das macas, das vacas, das pratas

Sou Ana de Amsterdam



* termo original vetado pela censura